Descrição de chapéu Análise Cenários 2019-2020

No Brasil, o futuro é duvidoso e o passado é incerto

Chegaremos ao novo ano melhores do que entramos no ano velho?

Michel Temer recebe Jair Bolsonaro na rampa do Planalto, em Brasília, no primeiro dia de 2019, para a cerimônia de posse do presidente eleito - Alexa Salomão/Folhapress

No Brasil, o futuro é duvidoso e o passado é incerto. Tanto que até a autoria da frase "No Brasil até o passado é incerto" é duvidosa —ora atribuída ao ex-ministro Pedro Malan, ora ao ex-presidente do BC Gustavo Loyola, ambos da gestão FHC.

Neste espaço, no ano passado, havia dez previsões/desejos. Findo 2019, seis não se confirmaram, dois se realizaram em termos e dois deram certo. Respectivamente:

→ Jair Bolsonaro seguiu sua retórica extremista de campanha; o presidente não governou para os 210 milhões de brasileiros, mas para sua base; muros não foram derrubados no mundo; a onda conservadora tentou calar a voz das minorias; a preocupação com a segurança pública atropelou as liberdades individuais; o mundo digital seguiu no Velho Oeste, em terra sem lei;

→ A economia voltou a crescer timidamente, juros e inflação caíram, mas o desemprego persiste; mesmo com os excessos revelados pela Vaza Jato, a corrupção parece ter diminuído, mas não a incompetência na gestão pública;

→ A reforma da Previdência foi aprovada; e o jornalismo profissional seguiu sendo valorizado, ao menos por aqueles comprometidos com a defesa do consenso iluminista, dos valores democráticos e da liberdade de expressão.

Também os números jogam na confusão. Os anos 10 acabam neste 31 de dezembro. A nova década não começa no dia 1º de janeiro de 2020, como anda se dizendo e escrevendo, mas um ano depois.

Teremos um dia capicua, que pode ser lido da esquerda para a direita e da direita para a esquerda: 02/2/20, que cai num domingo. Dezessete dias depois, em 19 de fevereiro, a Folha inicia a contagem regressiva para o seu centenário.

Chegaremos ao novo ano melhores do que entramos no ano velho?

Não se o critério é ambiental. O início da gestão Bolsonaro aumentou em 30% o desmate da Amazônia, até novembro. Também não se a régua for a política externa, que virou uma biruta comandada por fundamentalistas. Na tentativa de desaparelhar, a Cultura foi aparelhada com o sinal inverso —e desmontada no processo.

Mas a jovem democracia brasileira passou por um de seus principais testes de estresse em mais de 30 anos e sobreviveu. Os freios e contrapesos funcionaram quando acionados. Medidas provisórias e projetos de lei exóticos foram derrubados no Congresso ou anulados nos tribunais. As reformas avançam. A economia parece sair do buraco.

É preciso, porém, seguir vigiando.

Pesquisa Datafolha publicada no dia 8 de dezembro mostrou que 8 de cada 10 brasileiros desconfiam sempre ou quase sempre do que Jair Bolsonaro diz. Mesmo entre os eleitores bolsonaristas, 6 em cada 10 não confiam nunca ou quase nunca nessas falas.

Eles terão neste jornal um aliado para checar a veracidade das declarações presidenciais e a pertinência de seus atos, assim como as de todos os principais atores dos poderes constituídos, sejam quais forem seus partidos ou posição política.

Sérgio Dávila é diretor de Redação da Folha

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