Descrição de chapéu Análise Cenários 2019-2020

Efeitos do vazamento que atingiu a Lava Jato estão longe do fim

Em nenhum lugar o desconforto parece maior do que no Supremo Tribunal Federal

O explosivo vazamento que atingiu a Operação Lava Jato neste ano representou um golpe duro para as autoridades à frente da maior investigação sobre corrupção que o Brasil já conheceu, e seus efeitos parecem longe de ter se esgotado.

As mensagens trocadas pelos procuradores do caso, obtidas pelo site The Intercept Brasil e publicadas pela Folha e outros veículos de comunicação, expuseram a intimidade dos investigadores, colocaram em xeque seus métodos e apontaram abusos.

Elas também mancharam a reputação do ministro da Justiça, Sergio Moro, alimentando dúvidas sobre sua isenção como juiz nos quase cinco anos em que foi responsável pela operação no Paraná, até abandonar a magistratura para entrar no governo Jair Bolsonaro.

Moro continuou sendo aplaudido como herói nacional por seus admiradores. Mas até entusiastas da Lava Jato manifestaram incômodo diante das revelações que as mensagens vazadas produziram ao iluminar os bastidores da investigação.

Em nenhum lugar o desconforto parece maior do que no Supremo Tribunal Federal. Ministros que antes se alinhavam à Lava Jato sem piscar agora se mostram dispostos a impor limites mais estreitos às suas ações e submetê-las a escrutínio mais rigoroso.

A corte mandou reabrir dois processos da operação, após estabelecer um novo entendimento sobre a ordem em que devem ser apresentados os argumentos finais dos réus nos casos em que houver colaboradores da Justiça entre os acusados.

Graças ao STF, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recuperou o direito de recorrer em liberdade contra a sentença que recebeu de Moro no caso do tríplex de Guarujá e voltou às ruas.

Três anos após permitir que condenados em segunda instância como o líder petista fossem presos antes do julgamento de seus recursos pelos tribunais superiores, o Supremo decidiu restabelecer a orientação que vigorava antes, abrindo caminho para a soltura de Lula e outros acusados.

As mensagens vazadas ofereceram aos advogados do ex-presidente novos argumentos para sustentar uma ação movida contra Moro no STF. Questionam a imparcialidade do ex-juiz e pedem que a corte anule os processos enfrentados por Lula em Curitiba. O julgamento deve ocorrer em 2020.

Espera-se também que a Polícia Federal conclua em breve as investigações sobre a invasão das contas dos procuradores da Lava Jato no aplicativo Telegram, origem do material que o jornalista americano Glenn Greenwald, um dos fundadores do Intercept, afirma ter recebido de uma fonte anônima.

Não há dúvidas sobre a natureza criminosa das ações dos hackers que assumiram responsabilidade pela invasão, o que provavelmente impedirá a Justiça de aceitar as mensagens como provas lícitas. Ainda assim, a divulgação do seu conteúdo tornou impossível ignorá-las.

Ricardo Balthazar é repórter especial

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