Barman do Baretto sonha em abrir seu próprio bar na Paraíba

Bolinha cuida dos drinques do bar no hotel Fasano há quase 20 anos

Roberto de Oliveira
São Paulo

Um antigo balcão, um amontoado de bugigangas, um discurso acolhedor para manter a clientela. Era mais ou menos essa a lógica que movia as antigas bodegas do Nordeste, onde elas resistem ao avanço das redes de supermercado. Maior bodegueiro da pequenina Areia, cidade com pouco mais de 20 mil habitantes na Paraíba, Zé Gordo era pai de Francisco Valter Alves de Lima. Na lida diária com a venda, 
o velho não sabia ler, tampouco escrever.

Aos 17 anos, o rapaz, um dos sete filhos, achou que o mundo lhe reservava surpresas do outro lado do balcão. Num lampejo de dor, fez a mala, despediu-se da família e veio tentar a vida em São Paulo. Mas eis que a vida parecia correr sempre ao redor de um desses móveis comerciais. Do outro lado de um deles, um colega cozinheiro olhou para o seu rosto redondinho e o apelidou: Bolinha. Pronto! Assim seria chamado por colegas e clientes. 

 

Era 1999. O tal balcão ocupava os fundos de um imóvel na rua Amauri, 275-B, no Itaim Bibi, onde o paraibano trabalhava como ajudante no bar. Quatro anos depois, a casa se mudou para a rua Vittorio Fasano, 88, endereço nobre que abriga o hotel Fasano. Lá Bolinha foi alçado a barman do Baretto, reconhecido há duas décadas como reduto de boa música e ícone da noite paulistana.

“Para quem só conhecia cachaça, cerveja e copo americano, imagina”, brinca ele, enquanto lustra cuidadosamente um jogo de taças de cristal Spiegelau, marca alemã que existe há mais de cinco séculos. 

Em seguida, prepara um drinque de sua autoria: o ginger negroni (Campari, gin, Lillet Blanc e espuma de gengibre). Bolinha aproveita para mostrar um mimo da casa: uma garrafa de cristal Baccarat do conhaque Remy Martin Louis 13 —dose, R$ 2.500, a mais cara do cardápio no qual constam 292 rótulos e 62 drinques, sem contar os vinhos.

Num ambiente por onde já transitaram os atores John Travolta e Sharon Stone, a modelo Kate Moss e o vocalista dos Stones, Mick Jagger, Bolinha, 44, conhece clientes pelo nome, embora não veja distinção entre celebridades e anônimos. “No começo, ficava até assustado.”

A superação de uma doença o ensinou a ser mais generoso. Bolinha teve um câncer no estômago diagnosticado em 2016. Fez sete sessões de quimioterapia antes de se submeter a uma cirurgia. Ficou três meses longe do balcão. 

“No momento em que voltei a trabalhar, eu me esqueci das dores”, conta, empolgadíssimo.

Já é madrugada quando integrantes da banda do Baretto tomam assento para mais uma agradável rodada de jazz e bossa nova. 

Nesse ínterim, ele olha para o salão, avisa a um dos quatro garçons que alguém está chamando para, em seguida, desabafar. 

“Nordestino vem para São Paulo, mas mantém o sonho de regressar à sua terra natal”, diz ele, com a voz embargada. “Depois dessa jornada, quero paz!” 

Pensa em abrir um bar em Areia. Na fachada, quem sabe escrever: “Boteco do Bolinha”. 

Bodegueira das antigas, sua mãe, dona Severina, 66, não vê a hora de encontrar o filho novamente atrás de um balcão.

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Música ao vivo

O bar do elegante Hotel Fasano promove shows intimistas de jazz --volta e meia a agenda inclui medalhões nacionais e internacionais. Para acompanhar a dose de uísque Dewars White Label (R$ 42), fique com petiscos como o camembert ao forno com nozes e geleia de damasco (R$ 80) e a seleção de queijos, com brie, grana padano e gorgonzola (R$ 79).

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